Casa Padre Toledo lança novos olhares sobre a história e o patrimônio de Tiradentes
Museu foi reaberto na última sexta-feira com exposição que dialoga com os desafios contemporâneos da preservação
Por Jardel Santos | Campus Cultural UFMG em Tiradentes
Com Teste
O Museu Casa Padre Toledo, em Tiradentes, reabriu, na tarde de sexta-feira, dia 18, suas portas ao público com a inauguração da exposição Tiradentes Passado Presente, reunindo gestores da UFMG, autoridades locais, pesquisadores, artistas e a comunidade em uma cerimônia marcada pela emoção e pela reafirmação do compromisso com a cultura e a memória coletiva.
A atividade, que integrou a programação do 57º Festival de Inverno UFMG, celebrou a reativação simbólica e física de um dos mais emblemáticos espaços de memória do país, agora com nova expografia, que busca dialogar de forma mais direta com o presente, com as multiplicidades culturais da cidade e com os desafios contemporâneos da preservação e da inclusão.
O evento reuniu a reitora Sandra Regina Goulart Almeida, o pró-reitor de Cultura, Fernando Mencarelli, a diretora do Campus Cultural UFMG em Tiradentes, Patricia Franca-Huchet, além de curadores, servidores, colaboradores, representantes de comunidades tradicionais e moradores da cidade. Durante a solenidade, foram destacadas a importância do museu como espaço de encontro entre ensino, pesquisa, extensão e patrimônio, bem como sua potência como vetor de desenvolvimento cultural para a região.
Sandra Goulart Almeida destacou o simbolismo do momento e a conexão entre o espírito rebelde da cidade de Tiradentes e o papel da universidade mineira: “Quando pensamos em Tiradentes — não só a cidade, mas também a história — falamos de uma história de rebeldia. De uma conjuração mineira que deve sempre ser lembrada. E eu digo sempre: a UFMG também é muito rebelde, digna de ser uma instituição mineira em defesa da democracia e da liberdade. Não essa liberdade individualista que tantos propagam hoje em dia, mas a liberdade que é ansiada por todos nós, que nos permite construir uma sociedade mais democrática, mais justa e mais equânime”.
Percurso aberto
A nova exposição, idealizada como percurso aberto em constante transformação, convida o público a revisitar a história de Tiradentes sob diferentes perspectivas, conectando passado e presente por meio de temas como diversidade, religiosidade, modos de vida coloniais e participação das populações afrodescendentes na construção da identidade local.
A museóloga Lorena Mello, uma das responsáveis pela curadoria, ressaltou o papel social da proposta museográfica, que busca integrar o cotidiano da cidade ao acervo histórico da casa: “Essa junção do museu dito tradicional com o cotidiano da população tiradentina é um dos maiores trunfos da exposição pois valoriza o papel social dos museus — tão fundamental para a divulgação do conhecimento e também para o sentimento de pertencimento e identidade da população com o museu”.
Solar de muitas histórias
Instalado em um dos mais importantes edifícios do século XVIII, o Museu Casa Padre Toledo ocupa o antigo lar do influente padre inconfidente, que foi cenário de reuniões secretas dos conjurados que planejaram a revolta contra a Coroa Portuguesa no fim do período colonial. O edifício, tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), é também marco das primeiras iniciativas de preservação patrimonial no Brasil, idealizadas por Rodrigo Mello Franco de Andrade, cujo acervo integra parte da nova exposição.
A exposição convida os visitantes a explorarem os múltiplos usos e sentidos atribuídos à casa ao longo do tempo: de residência senhorial a sede administrativa, passando por teatro, cinema, seminário e, finalmente, espaço museológico. O próprio edifício é tratado como documento histórico e expositivo, com destaque para elementos como o torreão, o porão de pedra e as raras pinturas parietais setecentistas.
A coordenadora de Patrimônio Cultural da UFMG, Diná Marques Pereira, explicou a abordagem adotada nos cuidados com o acervo: “Não fizemos procedimentos de restauração, mas práticas curativas que permitissem uma leitura devida do público e também respeitassem a materialidade, a integridade, a história de cada peça que está exposta”, afirma ela.
Diálogos com a cidade
Com curadoria baseada em uma abordagem educativa, crítica e afetiva, Tiradentes passado presente propõe a valorização de saberes tradicionais, festas populares, manifestações religiosas e memórias coletivas. Estão presentes registros das irmandades negras, dos congados, das festas do Rosário, dos ofícios tradicionais, da vida cotidiana nas antigas Minas, bem como dos modos de resistência e afirmação identitária de comunidades historicamente silenciadas.
A mostra incorpora ainda obras e documentos de figuras fundamentais do modernismo e da política cultural brasileira, como Cândido Portinari, Lucio Costa, Roberto Burle Marx e Guignard, enfatizando o elo entre patrimônio e arte e entre conservação e criação.
Para a diretora do Campus Cultural UFMG em Tiradentes, Patricia Franca-Huchet, a entrega da exposição foi também uma experiência pessoal de descoberta: “Trabalhando nos bastidores, eu me senti uma artista trabalhando pelo avesso — isso foi muito interessante. Eu aprendi como é importante o patrimônio, como é maravilhoso cuidar e entregar este espaço para a cidade agora, todo reformado, pintado e cuidado.”
Cortejo de memória e ancestralidade
Ao final das falas de abertura e das curadoras, um momento de profunda beleza e força simbólica emocionou os presentes: a bandeira do Congado Nossa Senhora do Rosário e Escrava Anastácia, restaurada pela UFMG, foi solenemente entregue ao seu Capitão, o Mestre Prego. A bandeira, que já havia sido cedida pelo mestre para compor a exposição de longa duração do museu, necessitava de cuidados e foi cuidadosamente recuperada como parte do compromisso institucional com a preservação de patrimônios vivos e afetivos.
Em seguida formou-se um cortejo ao som do tambor de Mestre Prego e dos cantos do Congado, e a bandeira foi conduzida pela porta da frente do museu, atravessando o saguão até ser depositada no espaço expositivo que acolherá sua presença permanente. A cena, marcada pela oralidade, pela fé e pela memória, selou o espírito da exposição, reafirmando que o museu é também um lugar de celebração das vozes que sustentam a cultura tiradentina.
Patrimônio vivo e universidade presente
A reabertura do museu fortalece a atuação da UFMG em Tiradentes, por meio de seu campus cultural, como promotora de ações integradas de ensino, pesquisa e extensão destinadas à valorização da cultura, da arte e da memória. Em articulação com o Centro de Estudos e Biblioteca e com o Quatro Cantos Espaço Cultural, o museu pretende ampliar o acesso e incentivar o envolvimento da comunidade local e de visitantes em atividades formativas, exposições temporárias, oficinas e projetos de mediação cultural.
Tiradentes Passado Presente pode ser visitada gratuitamente de terça a domingo.
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